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12/10/2020 às 12:15

Crônica: A cidade dos cabeludos

Rodrigo Alves de Carvalho 

Naquela cidade todos os moradores se vangloriavam de seus cabelos. Lá quanto mais vastas e bonitas fossem as cabeleiras, mais importante e respeitado era o cidadão. Por isso, quem tinha dinheiro ostentava um cabelo extremamente bem cuidado, cheiroso, macio, comprido, que causava inveja. Quem tinha cabelos curtos e malcuidados não eram bem vistos pela sociedade, geralmente eram considerados a ralé, os pés raspados, enfim, a gentalha. 

E a pessoa que possuía o cabelo mais invejado por todos era Otaviano. O rapaz boa pinta, filho de família nobre e cabeluda, tirava o fôlego das mocinhas na cidade. Dono de uma cabeleira sem igual, Otaviano era um sujeito culto, sorridente e amigo de todos. Estudou Artes Dramáticas e logo trabalharia como ator, inclusive uma grande emissora de TV estava prestes a contrata-lo. 

Um dia Otaviano usou um shampoo que seu amigo lhe presenteara dizendo ser a novidade do momento fabricado na China. No outro dia Otaviano acordou careca. 

Desesperado, ele procurou médicos e dermatologistas, mas para sua infelicidade seu cabelo nunca mais iria crescer novamente. 

Quando a cidade ficou sabendo do acontecido, Otaviano tornou-se motivo de piada, foi discriminado, ofendido e até sofreu agressão física. Ninguém respeitava o ex-cabeludo bonitão, pois para os moradores daquela cidade, não ter cabelo era sinal de não ser ninguém. 

Otaviano foi embora.  

Alguns anos depois, com vários prêmios na bagagem e o papel de protagonista na novela das nove, Otaviano era um ator famoso e querido em todo país. Com tantas conquistas em sua vida, ele decidiu voltar para sua cidade natal rever os amigos e quem sabe receber um pedido de desculpa dos moradores pelos atos do passado. 

Quando chegou, uma festa o esperava, todos os moradores cabeludos seguravam faixas com palavras de carinho, Otaviano desfilou em carro aberto e no final houve discursos e homenagens no coreto da praça. Finalmente os fantasmas do passado pareciam exorcizados. 

O prefeito todo exibido com os cabelos até o chão entrega um presente para o famoso ator careca. Otaviano abre a caixa e fica confuso, o prefeito sorridente agracia o rapaz com as palavras: 

- Querido filho desta terra, o povo da cidade em meu nome lhe presenteia com essa bela e longa peruca magnifica, para que você possa, em outras oportunidades que for visitar nossa cidade, sentir-se igual perante seus conterrâneos! 

Otaviano foi embora novamente, só que nunca mais voltou. 

(*) Jornalista, escritor e poeta possui diversos prêmios literários em vários estados e participação em importantes coletâneas de poesia, contos e crônicas. Em 2018 lançou seu primeiro livro individual intitulado “Contos Colhidos” pela editora Clube de Autores. 


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