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Redação nota mil: o que os últimos três temas do Enem revelam e como se preparar para a prova em 2025

| Zeesy Grossbaum na Unsplash

A redação do Enem continua sendo uma das etapas mais temidas e decisivas da prova. Responsável por até mil pontos na nota final, o texto pode ser o diferencial na conquista de uma vaga no curso mais concorrido. Em 2025, a avaliação está marcada para 9 e 16 de novembro, sendo que a redação será aplicada já no primeiro dia.

De acordo com Jorge Viana de Moraes e Thais Rosa Viveiros, professores de Língua Portuguesa do Colégio Visconde de Porto Seguro, em São Paulo (SP), os temas escolhidos pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) nos últimos três anos seguiram uma linha clara, voltada a questões sociais e culturais urgentes no Brasil.

Para o professor Jorge Viana, a redação do Enem tem sido um agente fomentador de debates sociais e críticas de grande relevância no país há mais de 20 anos. Ela desenvolve a reflexão e a criticidade do cidadão médio para temas candentes entre nós. Um exemplo disso foi o desafio de 2022, que propôs a reflexão sobre a valorização de comunidades e povos tradicionais. Em 2023, a discussão girou em torno da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher. Já em 2024, a prova abordou os desafios para a valorização da herança africana no país.

Segundo o professor Jorge Viana, especialista em redação, essa sequência demonstra que a banca cobra cada vez mais do estudante a capacidade de pensar criticamente sobre desigualdades, identidade e diversidade cultural, porque, nos últimos anos, eles fazem parte do ponto de vista dos possíveis eixos temáticos comuns à redação do Enem. Eles são ao todo oito: 1. meio ambiente; 2. questões sociais; 3. saúde e ciência; 4. arte e cultura; 5. direito e cidadania; 6. educação; 7. tecnologia; e 8. economia. Tentar adivinhar o tema da redação de cada ano chega a ser ingênuo por parte do candidato. O que o candidato precisa dominar são as questões mais importantes (os hotpoints) e as críticas em torno desses oito eixos temáticos, trazidos mediante um repertório construído de forma crítica e em diálogo com as outras áreas e disciplinas escolares-acadêmicas.

Exemplo do que se afirma acima é que “É possível notar que a banca tem exigido cada vez mais uma reflexão crítica sobre desigualdades, identidades e diversidade cultural”, analisa o professor. “Não basta reproduzir dados: é preciso propor soluções viáveis, refletir sobre o contexto histórico e dialogar com os textos motivadores.” Aliás, a banca espera fortemente que o candidato não fique preso aos textos motivadores, e que eles sirvam apenas como uma espécie de acionamento ou mobilização do repertório do candidato. Quanto mais o texto do candidato ficar preso aos textos da coletânea, mais a redação demonstrará certa previsibilidade. Manter diálogo como os textos da coletâneo não significa, por assim dizer, ficar “preso” a esses textos. É preciso ir além.

A professora Thais, especialista em redações escolares, chama a atenção para um detalhe curioso: nos três últimos anos, o enunciado trouxe a palavra indutora “desafios”. Para ela, “isso revela que o Inep espera que os candidatos não apenas descrevam problemas, mas também identifiquem obstáculos reais e proponham intervenções concretas. Ou seja, a banca cobra do aluno a capacidade de perceber o mundo à sua volta e, a partir dessa percepção, fazer uma análise social seguida de uma intervenção que demonstre seu papel como cidadão”. Nesse ponto, ganha destaque a competência 5, que avalia a proposta de intervenção. “Para atingir a nota máxima, o estudante deve apresentar uma proposta que contemple os cinco elementos válidos obrigatórios: o agente responsável pela transformação, a ação transformadora, o modo por meio do qual é viável a realização dessa ação, os efeitos positivos dessa ação para a sociedade e, acompanhando esses elementos, a contextualização que embasa a proposta”, acrescenta a professora.

A análise dos últimos temas reforça essa exigência. Em 2022, os melhores textos relacionaram a preservação cultural de povos tradicionais a políticas públicas consistentes. Em 2023, o foco esteve na divisão sexual do trabalho e no reconhecimento social do papel feminino. Já em 2024, os candidatos que se destacaram foram capazes de articular referências literárias e históricas com propostas de políticas afirmativas. Thais alerta que o repertório deve ser aplicado de forma legitimada e produtiva ao tema, e não inserido de modo artificial, apenas para impressionar o corretor.

O que vale ponto na correção

O Inep avalia a redação do Enem a partir de cinco competências, cada uma valendo até 200 pontos: domínio da norma culta da língua portuguesa, compreensão da proposta e adequação ao tema, organização e defesa de argumentos, uso adequado dos mecanismos de coesão e coerência, e apresentação de uma proposta de intervenção detalhada.

O professor Jorge Viana observa que, apesar de a estrutura argumentativa ser um desafio para muitos, é a linguagem que costuma derrubar bons textos. Erros de concordância, acentuação ou uso inadequado de pronomes podem custar pontos preciosos e, por isso, a revisão final é fundamental. Outro aspecto que costuma tirar pontos é a falta de paralelismo sintático ou semântico, que faz com que os argumentos apresentados em frases e períodos acabem por ficar sem sentido. O texto que também não apresenta pelo menos uma inversão sintática, ou uma expressão parentética, tende a ter a nota descontada.

Para os candidatos de 2025, os professores do Colégio Visconde de Porto Seguro recomendam algumas estratégias práticas. A primeira é planejar o texto antes de começar a escrever com um rascunho rápido que contenha a contextualização do tema (ou a “ancoragem” do texto no tema – a oportunidade para o candidato mostrar seu repertório, desde que este, de fato, seja pertinente ao tema, como dito anteriormente); a apresentação da tese, de forma clara e objetiva, com, pelo menos, uma palavra de juízo de valor, tais como eficiente, empecilho e enfraquecido (“X não é eficiente”; Y é um empecilho”; Z é enfraquecido por...”; tal posicionamento de W é equivocado); e a antecipação dos dois argumentos, que serão desenvolvidos nos parágrafos subsequentes (parágrafos 2 e 3). Com isso, é possível ter um projeto de texto já no primeiro parágrafo.

É claro que não podem faltar os argumentos principais e a proposta de intervenção. A introdução deve ser clara, apresentando o tema e a tese que será defendida já no primeiro parágrafo, de modo a explicitar ao corretor o entendimento da frase temática proposta pelo Enem. No desenvolvimento, cada parágrafo precisa explorar um tipo de argumento diferente, sempre apoiado em repertório sociocultural legitimado, produtivo e pertinente ao tema. Muitos candidatos perdem pontos justamente aqui: com lacunas argumentativas, falsos desenvolvimentos e falta de fechamento do argumento, que é relacioná-lo de forma clara à tese. A proposta de intervenção deve ser detalhada, evitando generalizações como “educar a população” ou “divulgar informações”. Na hora da escrita, é importante diversificar os conectivos para garantir fluidez e manter o tom formal, sem a utilização de gírias ou linguagem subjetiva. Pensar nos conectivos como verdadeiros operadores argumentativos traz um peso considerável sobre a conexão que se deve fazer entre as diferentes partes do texto.

Quando questionados sobre o que pode cair na redação do Enem 2025, Jorge e Thais concordam que o eixo social deve continuar em destaque. Possíveis caminhos incluem discussões sobre tecnologia e desigualdade, saúde mental, desinformação, democracia e sustentabilidade. Ou seja, justamente aqueles que fazem parte da base dos oito eixos temáticos previstos para a redação. Para os educadores, mais importante do que tentar adivinhar o tema é treinar a estrutura do texto dissertativo-argumentativo e manter-se informado sobre os principais debates da sociedade brasileira, que passam por esses oito eixos temáticos previstos no Enem.

Os professores montaram propostas de intervenção com base nos últimos anos das redações do Enem. Cada proposta responde às cinco perguntas essenciais da competência 5: quem fará, o que fará, como fará, para que fará e com qual finalidade. E deve estar intimamente relacionada à linha argumentativa desenvolvida ao longo do texto, sem destoar dele. Para eles, esse nível de detalhamento e articulação entre as partes pode diferenciar uma redação comum de uma redação nota mil.

Tema -  Proposta de intervenção (exemplo nota mil)

2022 — Valorização de comunidades e povos tradicionais

O Ministério da Educação, em parceria com as Secretarias de Cultura estaduais, deve incluir nos currículos escolares disciplinas optativas sobre culturas tradicionais brasileiras. Isso deve ser feito por meio da inclusão dessas disciplinas nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e da utilização de materiais didáticos produzidos em conjunto com lideranças comunitárias indigenistas. Desse modo, será possível promover a valorização e a preservação do patrimônio cultural e ambiental dos povos originários no arcabouço social e histórico nacional.

2023 — Invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher

O Congresso Nacional, em conjunto com o Ministério do Trabalho, deve aprovar leis que assegurem remuneração e benefícios previdenciários às cuidadoras domiciliares. Isso deve ser feito por meio da utilização de fundos federais de assistência social para o custeio inicial desse projeto, com o objetivo de garantir reconhecimento econômico e social para esse trabalho historicamente invisibilizado e, com isso, promover justiça às mulheres.

2024 — Valorização da herança africana no Brasil

O Ministério da Cultura, em parceria com escolas públicas e ONGs ligadas ao movimento negro, deve promover festivais anuais de cultura afro-brasileira nas capitais do país. Isso deve ser feito por meio de editais públicos de financiamento cultural divulgados de modo amplo pelas plataformas digitais com o fim de atrair a participação ampla da sociedade civil. Assim, será possível fortalecer a valorização da herança africana e, como consequência, combater o racismo estrutural que permeia a realidade brasileira.

Fonte: Colégio Visconde de Porto Seguro

A aplicação das provas do Enem será realizada nos dias 9 e 16 de novembro e os resultados serão divulgados em janeiro de 2026. Até lá, a orientação dos especialistas é clara: dominar a estrutura do texto, alinhar argumentos sólidos ao tema proposto e apresentar uma intervenção completa são as chaves para conquistar a sonhada redação nota mil.

Sobre o Colégio Visconde de Porto Seguro

Fundado em 1878, o Colégio Visconde de Porto Seguro é uma conceituada instituição de ensino do Brasil, com campus em São Paulo e Valinhos, que prima pela inovação educacional e pelo desenvolvimento de múltiplos talentos e competências dos alunos da Educação Infantil ao Ensino Médio, tanto no Currículo Internacional como no Currículo Bilíngue. Comprometido com uma ampla e sólida formação pluricultural e plurilinguística, conquistou diversas certificações internacionais, como o selo de Exzellente Deutsche Auslandsschule, do governo alemão, que qualifica o Porto como uma escola alemã de excelência no exterior; a da Fundação Alemã Casa do Pequeno Cientista e a da Rede de Escolas Associadas da Unesco. Em 2022, passou a ser reconhecido como uma Escola Internacional, conforme o termo de acordo internacional com o governo da Alemanha.

Fonte: Assessoria