Nos últimos anos, o ambiente corporativo tem se tornado palco cada vez mais frequente de crises emocionais graves. Casos de colaboradores entrando em surto, sofrendo ataques de pânico ou demonstrando comportamentos confusos e descontrolados deixaram de ser exceções para se tornarem episódios recorrentes — e muitas vezes mal compreendidos.
A saúde mental dos trabalhadores brasileiros vive uma situação crítica. Em 2024, foram registrados mais de 472 mil afastamentos por transtornos psicológicos, o maior número da década, com um aumento de 68% em relação ao ano anterior. Ansiedade, depressão e síndrome de burnout despontam como os principais diagnósticos.
Segundo o psiquiatra Vicente Beraldi Freitas, médico e gestor de saúde conhecido como Dr. Estresse, “o cenário atual é consequência de uma combinação de fatores sociais, econômicos e culturais — e agravado pela pandemia, que desestruturou completamente a relação das pessoas com o trabalho e com elas mesmas”.
Esse contexto revela a urgência de uma mudança na forma como as empresas encaram a saúde mental. Mais do que oferecer benefícios pontuais ou campanhas de conscientização, é necessário criar protocolos concretos para lidar com situações de emergência psicológica — os chamados Primeiros Socorros Psicológicos (PSP).
O que são Primeiros Socorros Psicológicos?
Os Primeiros Socorros Psicológicos são um conjunto de atitudes simples e imediatas, aplicadas no momento em que uma pessoa apresenta sinais de crise emocional aguda. O objetivo é oferecer acolhimento, segurança e apoio inicial até que o atendimento especializado possa ser feito.
Vicente Beraldi explica que esses primeiros momentos são decisivos. “Uma abordagem errada, mesmo que bem-intencionada, pode agravar a situação. As pessoas precisam entender que acolher não é resolver o problema, é estabilizar o emocional de quem está em colapso.”
Como agir em uma crise emocional no trabalho?
A atuação em casos de crise exige sensibilidade e preparo. Algumas orientações básicas são consideradas essenciais:
- Mantenha a calma. Falar em tom tranquilo ajuda a estabilizar o ambiente.
- Ouça sem julgamento. Não pressione a pessoa a falar mais do que quer.
- Garanta privacidade. Afaste outras pessoas para evitar exposição e desconforto.
- Não minimize o sofrimento. Frases como “isso vai passar” ou “você está exagerando” devem ser evitadas.
- Ajude na respiração. Sugira que a pessoa respire profundamente, em um ritmo lento e constante.
- Torne o ambiente seguro. Elimine estímulos que possam agravar a crise.
- Acione suporte especializado. Psicólogos, médicos ou serviços de emergência devem ser chamados imediatamente.
Esses procedimentos não substituem o tratamento médico, mas atuam como uma ponte crucial entre a crise e a assistência profissional.
Prevenção e estrutura: por que a empresa precisa estar preparada?
Para além da contenção imediata, a organização deve olhar para o problema com seriedade estratégica. “Agir com rapidez salva vidas, reduz afastamentos prolongados e evita acidentes de trabalho. Mas é ainda mais importante criar uma cultura de saúde mental, onde os riscos psicossociais sejam reconhecidos e enfrentados desde a base,” afirma Beraldi.
A atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), que passa a vigorar em maio de 2025, obriga as empresas a incluírem a avaliação de riscos psicossociais no seu processo de gestão de saúde e segurança. Pressão por metas excessivas, assédio moral e sobrecarga de trabalho passam a ser, formalmente, passíveis de fiscalização e sanção.
“O momento exige das empresas uma revisão profunda nas relações de trabalho. O perfil dos problemas mudou: se antes afastamentos eram por lesões físicas, hoje, são por esgotamento emocional,” reforça Tatiana Gonçalves, da Moema Medicina do Trabalho.
O impacto humano e econômico da negligência
Os dados da Organização Mundial da Saúde indicam que os transtornos mentais geram uma perda global de US$ 1 trilhão por ano em produtividade. No Brasil, a crise afeta principalmente mulheres, que respondem por 64% dos afastamentos. A maioria delas enfrenta dupla jornada, pressão por desempenho e pouco reconhecimento.
Além dos custos econômicos, há um impacto direto no clima organizacional: aumento da rotatividade, queda na motivação e conflitos interpessoais.
O que as empresas podem fazer além da emergência?
Vicente Beraldi destaca que o cuidado com a saúde mental precisa ser contínuo, não reativo. Ele sugere a criação de grupos de escuta e vivência emocional, ambientes de trabalho colaborativos e estruturas permanentes de acompanhamento psicológico dentro das empresas. “Estamos falando de uma responsabilidade ética, não apenas de gestão. As empresas são parte do problema e precisam ser parte da solução.”
Diante da complexidade e da frequência dos surtos emocionais no ambiente corporativo, não basta mais esperar. Estar preparado para agir com empatia, respeito e orientação correta pode ser a diferença entre o agravamento e a recuperação de um trabalhador. E, em tempos de crise silenciosa, o silêncio e a omissão são os maiores riscos.
Fonte: Assessoria
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