Nessa segunda-feira (12) o Ministério Público de Alagoas (MPAL), por meio do Núcleo de Defesa da Saúde Pública (Nudesap), esteve reunido com a Defensoria Pública Estadual (DPE), com a Secretaria de Estado da Saúde (SESAU) e com os gestores públicos municipais dos 11 municípios que integram a 3ª Região de Saúde de Alagoas para discutir sobre internações involuntárias e compulsórias de acordo com as diretrizes da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). O foco foi estabelecer fluxos de atendimento, pactuar responsabilidades institucionais e fortalecer a articulação intersetorial em defesa dos direitos das pessoas em sofrimento psíquico.
Durante a reunião, que teve duração de cinco horas, a defensora pública Roberta Gisbert explanou sobre a Tutela de Direitos na Saúde Mental, enfatizando que os pacientes com transtornos mentais e/ou em sofrimento psíquico precisam ser protegidos de qualquer tipo de discriminação ou negligência, inclusive dentro do próprio sistema de internação, citando o caso Damião Ximenes Lopes, que se trata da primeira condenação do Brasil perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos devido às fortes violações de direitos constatadas contra pessoas hipervulneráveis dentro de instituições hospitalares totais, alcunhadas de manicômios.
O momento também serviu para dialogar e ouvir sobre as dificuldades encontradas pelos municípios, concedendo a fala aos secretários municipais e coordenadores de saúde. Foi evidenciado que na 3ª Região, composta por 11 municípios, existem 6 CAPS, porque os demais são considerados de pequeno porte para o requisito de estruturação da referida unidade de atendimento . O foco da discussão foi, portanto, a priorização do tratamento desses pacientes dentro do seu território, com uso dos equipamentos disponíveis na RAPS da 3ª Região de Saúde, sem envio de pacientes para o Hospital Portugal Ramalho, localizado na capital, o qual é referência e, há 69 anos, o único hospital psiquiátrico em Alagoas. Tanto o MPAL como a DPE enfatizaram que a existência e manutenção desse hospital psiquiátrico vai de encontro às normativas do Ministério da Saúde e à reforma psiquiátrica.
O foco das discussões foi a priorização do tratamento desses pacientes dentro do seu território, sem envio de pacientes para o Hospital Portugal Ramalho que é referência e, há 69 anos, o único hospital psiquiátrico em Alagoas. Porém ressaltado que, com a reinauguração do Hospital Geral de Murici foram disponibilizados nove leitos para pacientes psiquiátricos, sendo cinco para homens.
Outro ponto destacado foi a necessidade de assistência voltada às comunidades quilombolas e indígenas existentes na 3ª RS, para as quais devem ser voltados equipamentos e profissionais de saúde que possam lidar com suas especificidades. Além disso, enfatizou-se também a Resolução n.º 249, do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), que proíbe terminantemente o tratamento de crianças e adolescentes em comunidades terapêuticas, sendo esse, para os participantes, um dos assuntos mais delicados e que exige dos profissionais um cuidado excepcional, visto que nem mesmos os hospitais com leitos de saúde mental disponibilizam espaços apropriados para o público infantojuvenil.
“Esse é um assunto que discutimos há algum tempo, precisamos avançar, fazer com que as leis sejam cumpridas. Não é fácil, é bastante delicado, exige empenho dos gestores para que possamos assegurar a essas pessoas com transtornos mentais serviços de apoio, tratamento e acompanhamento dignos, e não um tratamento ultrapassado e preconceituoso que, em vez de proteger, agride e piora o quadro de saúde. Em pleno século XXI não podemos permitir que essas pessoas sejam marginalizadas e retiradas do convívio social para não incomodar aos demais. Então, o Ministério Público e a Defensoria Pública do Estado se uniram com esse propósito, o de defender a cidadania e a dignidade dessas pessoas”, explica a promotora de Justiça e coordenadora do Nudesap, Micheline Tenório.
Para o defensor público estadual, Marcelo Arantes, o assunto é delicado mas, paulatinamente, com a insistência nos debates, e a disposição dos gestores, redes de atenção eficazes estarão acolhendo os cidadãos alagoanos.
“Sabemos que a implementação e o fortalecimento, sobretudo da rede psicossocial, é um desafio hercúleo. Esse diálogo é muito importante, fazemos reuniões com esse propósito, para discutir saúde mental, não somente em Maceió, mas em todo estado, pois mesmo que tratemos só de Maceió reflete no estado todo, pois temos unidades que recepcionam pessoas de todos os municípios, um hospital que ainda é referência em saúde mental para fins de internação em Alagoas. Palavras não minhas, mas do Ministério da Saúde, esse tipo de equipamento acaba dificultando a perfeita implementação das RAPS, mas este é um assunto para outro momento”, disse o defensor.
Sobre a questão das internações em clínicas involuntárias e compulsórias, a superintendente da Superintendência de Atenção Primária e Ações Estratégicas (SUAPAE), Teresa Moura Tenório, evidenciou que corriqueiramente são encontradas irregularidades.
“São equipamentos que não fazem parte da rede, temos registros de fatos inaceitáveis, uma porção de inconsistências, violando os direitos dos usuários, como por exemplo o de o paciente ser colocado em um quarto, trancado de chave pelo lado de fora, de os parentes enviarem cartas e estas serem lidas antes deles, o que é uma violação e causa danos. Quem realmente defende a reforma psiquiátrica e a dignidade das pessoas fica muito ferido, devemos salvar vidas ou permitir que sejam violadas? As clínicas ainda estão sendo mantidas para internação mas precisamos repensá-las e juntos encontrar estratégias para superar e garantir que se cuida realmente dessas pessoas”, afirma superintendente.
Teresa Moura ressaltou que os municípios da 3ª Região já estão desenvolvendo projetos que podem culminar em uma assistência digna, tendo, inclusive, numa amostra com mais de 300 trabalhos sobre “O SUS que dá certo”, Santana do Mundaú foi vencedor. Também foi evidenciado na reunião o exemplo de União dos Palmares que vem conseguindo implementar a RAPS para o atendimento dos pacientes de saúde mental sem a necessidade de internação destes, e em Murici está sendo reinaugurado o Hospital Geral com a disponibilização de 9 leitos para pacientes psiquiátricos.
Entre as falas dos participantes, a secretária municipal de Saúde de Santana do Mundaú, Paula Gomes, destacou que é preciso fortalecer a assistência de atenção primária, juntar profissionais e gestores.
“É preciso saber definirmos os papéis, estabelecer paradigmas e quebrar estigmas, temos que pensar em reintegração social. Outro ponto importante é trabalharmos a questão dos leitos ociosos em hospitais de pequeno porte, já em relação a não podermos enviar mais pacientes ao Portugal Ramalho, penso que as recusas fizeram os municípios pensarem melhor no que poderiam mudar em termos de assistência a essas pessoas. Quanto mais nos mobilizarmos e nos unirmos, quanto mais iniciativas forem implementadas em cada município, mais esforços forem empreendidos visando promover mudanças, mais sucesso teremos”, enfatiza a secretária.
Também representando o mesmo município, a psicóloga e coordenadora de Saúde Mental, Angélica Raquel, colocou como indispensável um olhar mais humanizado ao paciente psiquiátrico.
“Entendo que, nesse contexto, o acolhimento respeitoso, com mais sensibilidade é o que nos leva ao êxito. Quando temos um olhar mais empático e conseguimos convencer o paciente de que ele deve ser cuidado, os ganhos são visíveis para todos”, reforça a coordenadora.
Como encaminhamento, foi agendada uma próxima reunião com os gestores e a equipe técnica dos municípios da 3ª RS para o próximo dia 11 de junho com a finalidade de dar continuidade aos trabalhos de fortalecimento da RAPS dessa região de saúde.
Ascom MPAL
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