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Maceió/Al, 02 de abril de 2025

Colunistas

Arnóbio Cavalcanti Arnóbio Cavalcanti
Doutor em Economia pela École des Hautes Études en Sciences Sociales, HHESS, França. Professor da Universidade Federal de Alagoas com linhas de pesquisa em Finanças Públicas, Economia do Setor Público, Macroeconometria e Desenvolvimento Regional.
31/03/2025 às 13:04

Governo Ronaldo Lessa: a herança do empobrecimento de duas décadas

O Brasil apresentou um crescimento do PIB que superou a média mundial na maior parte do século XX. Entre 1950 e 1980, por exemplo, o PIB brasileiro cresceu a uma taxa anual de 7,1%, quase o dobro do crescimento global.

Contudo, nas décadas de 80 e 90, essa realidade se alterou: o Brasil passou a crescer menos do que a média mundial. Entre 1981 e 1990, enquanto o PIB global apresentou um crescimento acumulado de 38,4%, o PIB brasileiro teve um crescimento de apenas 16,6%, o que correspondeu a 1,55% ao ano.

Entre 1991 e 2000, o PIB mundial cresceu acumuladamente 37,6%, enquanto o Brasil registrou um crescimento de 29,3%. A taxa média de crescimento anual foi de 3,24% no cenário global e de 2,6% no Brasil. Portanto, apesar de os anos 90 terem mostrado um crescimento superior em relação à década anterior no Brasil, esse avanço ainda foi inferior ao desempenho da economia global.

Enquanto o Brasil diminuía em comparação ao resto do mundo, Alagoas também enfrentava uma queda em relação ao Nordeste e ao Brasil. Para ilustrar, em meados da década de 90, Alagoas representava mais de 5% do PIB do Nordeste, caindo para 4,87% no final daquela década. Em relação ao PIB do Brasil, sua participação era de 0,68%, que diminuiu para 0,63%. Em janeiro de 1999, quando Ronaldo Lessa assume o governo, a economia de Alagoas enfrentava uma crise sem precedentes, refletindo a deterioração econômica do Brasil em relação ao cenário global e a situação do estado em comparação com o Nordeste e o restante do país.

Uma síntese do empobrecimento relativo de Alagoas, que havia atingido seu "fundo do poço", pode ser encontrada no relatório anual de 1999 do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). Nesse documento, Alagoas registrou o menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) entre todos os estados brasileiros, evidenciando sua condição como o estado menos desenvolvido do Brasil. Além disso, a cidade de São José da Tapera era destacada como o município mais pobre do país. Diante desse cenário de crise, o governador Ronaldo Lessa iniciou sua gestão.

Analisaremos diversos aspectos do desempenho da economia alagoana durante os dois mandatos de Ronaldo Lessa (1999 – 2006) em dois artigos. Neste primeiro artigo, abordaremos alguns aspectos da situação socioeconômica deteriorada encontrada em Alagoas no início de sua gestão. No próximo, discutiremos as medidas adotadas pelo governador Ronaldo Lessa para enfrentar a crise econômica em Alagoas e os resultados alcançados ao longo de sua administração.

Inicialmente, é importante destacar que o empobrecimento relativo de Alagoas em comparação com o Nordeste e o Brasil teve um impacto negativo considerável na distribuição de renda e na qualidade de vida da população do estado. Naquele período, os 10% mais ricos de Alagoas conseguiram manter e até aumentar sua fatia da renda, enquanto a maior parte da população enfrentou condições de vida difíceis. Em 1999, por exemplo, 44,43% dos alagoanos viviam em situação de exclusão social, sendo que 80% desse grupo estava empregado em trabalhos informais e a taxa de desemprego urbano ultrapassava os 18%.

Em 1999, a estrutura fundiária de Alagoas evidenciava também uma grande desigualdade e não contribuía para diminuir a situação de exclusão social da população alagoana. Mais de 96% dos estabelecimentos agropecuários possuíam menos de 100 hectares e controlavam apenas 35% da área total. Em contrapartida, os estabelecimentos com mais de 1.000 hectares, que representavam apenas 0,2% do total, detinham mais de 19% da área total.

Essa concentração de terras nas mãos de poucos contribuiu para acentuar a desigualdade no estado. O índice de Gini, que avalia a desigualdade de renda, alcançou valores próximos a 1 em 1999, tornando Alagoas o estado mais desigual do Brasil.

Ronaldo Lessa começou sua gestão com mãos atadas para ajudar significativamente àquela população desfavorecida socialmente, visto que encontrou Alagoas com dificuldade de pagar a folha de servidores públicos e listado no "cadastro dos Estados inadimplentes" em todas as esferas administrativas do governo federal. Mais de 20 mil servidores públicos do Estado aderiram ao Programa de Desligamento Voluntário (PDV).

Essa situação impedia o estado de receber ou captar recursos externos, além de dificultar a celebração de convênios e contratos de repasse, comprometendo, assim, a capacidade do estado de investir em infraestrutura, educação e saúde e ampliar sua rede de assistência social.

Para demonstrar a gravidade daquele momento em termos de captação de recursos, é significativo destacar o caso do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que, naquele período, alocou mais de R$ 2,4 bilhões na infraestrutura do Nordeste por meio do Prodetur I. Contudo, Alagoas não recebeu absolutamente nada, totalizando R$ 0,0. Apenas no final do governo, após o governo estadual arrumar minimamente as contas públicas, Maceió e Maragogi foram os municípios beneficiados com uma pequena fração desse investimento.

A evidente fragilidade socioeconômica de Alagoas, herdada no início da gestão de Ronaldo Lessa, pode ser observada pelo fato de que, na época, havia 243 mil aposentados e pensionistas no estado, o que correspondia a quase 10% da população. Em praticamente todos os municípios, a aposentadoria de um ou dois membros da família era a principal fonte de renda.

 Dessa forma, as famílias dependiam fortemente da previdência para sua subsistência, e os aposentados se tornavam clientes preferenciais do comércio local. Por conseguinte, com o governo estadual limitado em suas ações para impulsionar a economia local, Alagoas tinha se tornado essencialmente dependente dos benefícios previdenciários federais para estimular sua economia.

Como resultado, o nível de desemprego disparou. Para ilustrar essa situação, entre 1992 e 1999, a População em Idade Ativa (PIA) de Alagoas cresceu significativamente, passando de 939 mil para 1,167 milhão de pessoas. No entanto, esse aumento não foi acompanhado por uma expansão proporcional no mercado de trabalho.

Assim, em 1999, uma parte alarmante da população em idade ativa do estado estava desocupada. Quase 60% dos alagoanos nessa faixa etária não estavam empregados, o que representou a maior taxa de inatividade do Nordeste e do Brasil. Esse dado evidencia a gravidade do problema do desemprego e da inatividade econômica em Alagoas naquele período.

Por fim, é importante destacar o estado precário da educação pública quando Ronaldo Lessa assumiu o governo. A situação educacional em Alagoas era chocante: a taxa de analfabetismo entre pessoas com 15 anos ou mais alcançava 32,8%, a maior do país.

Além disso, 58,4% das pessoas com 10 anos ou mais eram consideradas analfabetas funcionais, ou seja, não possuíam habilidades básicas de leitura e escrita. A situação era ainda mais grave no meio rural, onde 79,88% da população apresentava analfabetismo funcional, em contraste com 53,04% no meio urbano.

A taxa líquida de escolaridade em Alagoas também apresentava um cenário deprimente. No ensino fundamental, a taxa foi de 86,3%, enquanto no ensino médio alcançou apenas 11,5%. No Nordeste, as taxas de escolaridade para o ensino fundamental e médio foram de 90,0% e 14,5%, respectivamente. Em comparação, no Brasil como um todo, as taxas foram de 95,3% e 30,8%. Isso indicava que Alagoas estava abaixo da média tanto regional quanto nacional em ambos os níveis de ensino.

Em suma, esses dados evidenciam a falta de prioridade atribuída à educação como um meio de promover a distribuição e o crescimento sustentável da renda em Alagoas, onde o governo se via limitado na captação de recursos para reverter essa situação.

No próximo artigo, abordaremos como o governo de Ronaldo Lessa implementou uma revolução fiscal e administrativa, resultando em uma gestão significativamente melhor do que a que encontrou, com impactos positivos na socioeconomia e nas perspectivas da economia alagoana.

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