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Maceió/Al, 12 de novembro de 2024

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Arnóbio Cavalcanti Arnóbio Cavalcanti
Doutor em Economia pela École des Hautes Études en Sciences Sociales, HHESS, França. Professor da Universidade Federal de Alagoas com linhas de pesquisa em Finanças Públicas, Economia do Setor Público, Macroeconometria e Desenvolvimento Regional.
01/11/2024 às 09:41

A curva de Laffer e a atual reforma tributária brasileira

O conceito da curva de Laffer é normalmente traduzido pelo ditado popular: “cuidado para não esticar demasiadamente a corda, pois ela pode se romper”. Esse dito pode ser empregado também na economia quando o assunto for carga tributária e arrecadação governamental. Os defensores dessa corrente acreditam que não é fiscalmente rentável aumentar a carga tributária (taxa de imposto) para além de um determinado limite, denominado taxa "proibitiva", pois pode gerar uma queda na arrecadação dos cofres públicos.  A ideia é que “aumento de impostos matam impostos”. A curva foi assim utilizada pela equipe econômica do então ministro Paulo Guedes, no governo Bolsonaro, quando afirmava que a “redução da carga tributária brasileira poderia levar a um aumento nas receitas do governo”.

Paradoxo da tributação

Estamos diante do paradoxo da tributação: quanto mais aumentam os impostos, mais prejudicam a economia de mercado e, ao mesmo tempo, o próprio sistema tributário.

A ideia da curva de Laffer, ao relacionar a carga tributária e o caixa do governo, produz dois efeitos: um efeito aritmético e outro econômico.

O efeito aritmético nas receitas orçamentárias ocorre quando o governo resolve aumentar/reduzir sua carga tributária. Caso o governo resolva aumentar os tributos, terá como efeito aumento da arrecadação.

Em termos econômicos, todavia, o aumento da carga tributária provoca efeito perverso no mercado de trabalho, diminuindo a produção e emprego, influenciando assim o comportamento dos agentes e, em particular, reduzindo a arrecadação do governo. Os economistas liberais acreditam que o aumento da carga tributária excessiva, serve de pretexto para se aumentar o nível de sonegação fiscal na economia, provocando queda na arrecadação.

Assim, o efeito aritmético e o efeito econômico movem-se sempre em direções opostas. Eis o dilema ou paradoxo da tributação.

Contexto histórico

Ao contrário do que o seu nome indica, esta ideia é muito anterior ao trabalho do economista Arthur Laffer.

A história da Curva de Laffer aparece em 1978 com um artigo publicado no The Public Interest pelo jornalista J. Wanniski, intitulado "Impostos, Receitas e a Curva de Laffer". A ideia desse tema surgiu num jantar em Washington, ocorrido em dezembro de 1974, entre o próprio J. Wanniski, D. Rumsfeld (assessor presidente G. Ford) e os economistas A. Laffer (Universidade de Chicago) e Dick Cheney (deputado e ex-colega de Laffer). Durante a conversa no jantar, A. Laffer teria apresentado uma curva ilustrando o trade-off entre carga tributária e as receitas do governo. J. Wanniski logo denominou de "curva de Laffer", que se tornou muita popularidade nos anos 1980, após ser empregada durante a administração do presidente dos EUA R. Reagan - o governo Reagan baixou a carga tributária da economia e teve como consequência o aumento de arrecadação pública - em 1986.

A primeira citação desse paradoxo, entretanto, aparece no século XIV, na obra La Muqaddima do filósofo e historiador tunisino Ibn Khaldoun. Esse assunto voltou a ser abordado nas obras dos economistas clássicos, notadamente de A. Smith e Jean-Baptiste Say. Versão mais recente surge na obra The Means to Prosperity (1933), de J. M. Keynes. Para Keynes, “uma carga tributária elevada pode ser que anule a arrecadação do governo, dificultando a obtenção do equilíbrio do orçamento público”.

A taxa de imposto ideal

A questão central da curva de Laffer é como determinar a taxa óptima de imposto que permita se chegar à maximização das receitas do Estado. Vários estudos foram realizados nas últimas décadas para se chegar ao valor dessa taxa.

Mais recentemente, em 2017, o economista J. Lundberg testou a curva de Laffer em 27 países da OCDE. O trabalho conclui que a taxa de imposto que maximiza a arrecadação fiscal desses países gira em torno de 40%, porém depende de elementos estruturais das economias dos países: composição dos impostos obrigatórias, o histórico da política fiscal do país, o nível de aversão ao risco dos agentes econômicos ou mesmo a classificação de risco das agências internacionais. O estudo mostrou também que a maioria dos países fixaram suas cargas tributárias abaixo da taxa máxima ideal. Por outro lado, cinco países - Áustria, Bélgica, Dinamarca, Finlândia e Suécia - estão praticando uma carga tributária acima da taxa ideal, o que significa que poderiam, neste caso, reduzir as suas cargas tributárias (reduzir impostos) e, com isso, aumentar suas arrecadações.

Curva de Laffer e a polarização ideológica da economia brasileira

A curva de Laffer tem sido um marcador de divisão entre os macroeconomistas brasileiros: para os economistas de oposição ao governo e defensores do estado mínimo, a curva de Laffer é a prova de que uma política de redução geral dos impostos pode consolidar o equilíbrio das contas públicas brasileiras. Para os economistas do governo, a curva de Laffer é apenas uma arma ideológica usada pelos liberais nessa guerra ideológica, iniciada na segunda metade dos anos 2010.

Como você se vê nesse embate da reforma tributária brasileira?


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