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Maceió/Al, 22 de dezembro de 2024

Colunistas

Jorge Luiz Bezerra Jorge Luiz Bezerra
É professor universitário, advogado, Mestre em Direito pela Universidade Estadual Paulista (UNESP), delegado de Polícia Federal aposentado, especialista em Política Criminal, Segurança Pública e Privada, além de autor de diversos livros e artigos jurídicos.
26/11/2019 às 08:23

Massacres em ambientes fechados no Japão

Japonês que matou 19 pessoas em centro psiquiátrico sorrir para as câmeras Japonês que matou 19 pessoas em centro psiquiátrico sorrir para as câmeras

Em que pese, a rigorosa legislação nipônica de controle de armas, os altos índices da educação, saúde e segurança, o Japão vez ou outra é sacudido por terríveis chacinas em escolas, hospitais, metrôs, parques etc. Um dos piores massacres do país ocorreu na aldeia de Kamo, em Okayama, em maio de 1938. Mutsuo Toi, um homem de 21 anos, cortou a eletricidade da aldeia e matou 30 pessoas, incluindo a avó, para tanto fez uso de espingarda, espada e machado. se matando em seguida. Toi afirmou ter se sentido excluído dos outros habitantes da vila.

Na sequência, traremos a baila algumas chacinas provocadas por lobos solitários na terra do Sol Nascente e, após concluiremos numa sucinta análise sobre esses fenômenos criminosos no Japão.

Massacre da Escola de Ikeda/Japão

Ataque
Em 08/06/2001, às 10:15h, horário local, o ex-zelador de 37 anos,  Mamoru Takuma, entrou na escolinha, armado com uma faca de cozinha e começou a esfaquear crianças e professores. Ele matou 8 crianças, a maioria com 7 e 8 anos de idade, e feriu gravemente outras 13 crianças e 2 professores.

Contexto
Takuma foi diagnosticado com transtorno de personalidade paranoide. Após o ataque, ele foi condenado e sentenciado à morte, tendo sido enforcado em 14.09.2004. O incidente, no entanto, diferenciou-se pela idade das vítimas, a localidade (uma escola) e histórico de transtorno mental do perpetrador. Devido a esses fatores, o ataque levantou questões sobre as políticas sociais do Japão para lidar com transtornos mentais, os direitos das vítimas e dos criminosos e a acessibilidade e segurança das escolas japonesas.

Após o ataque, Yoshio Yamane, o diretor administrativo da escola, anunciou que montaria uma guarda de segurança, uma prática inédita nas escolas japonesas.

Modus operandi
Às 10:15h, da manhã de 8 de junho de 2001 em Osaka, no Japão, na escola primária de Ikeda para crianças privilegiadas, o ex-zelador de 37 anos, Takuma entrou na escola armado com uma faca de cozinha de 11 polegadas (28 cm) e começou a esfaquear aleatoriamente crianças e professores enquanto ria.

Takuma metodicamente foi de uma sala de aula para a outra, enquanto crianças e professores corriam horrorizados, suas vítimas tinham idades entre 7 e 13 anos. Desmembrou várias crianças, incluindo a remoção dos olhos de uma menina. No final, sua contagem de corpos era de 8 crianças (7 meninas e 1 menino) seriamente mutilados 15, antes de ser abordado e contido por 2 professores substitutos, segundo a mídia, durou pouco mais de 10 minutos.

Uma garota da 6ª série disse à Reuters: "Estávamos ouvindo um anúncio pelo alto-falante, e então foi interrompido por um grito e um barulho como uma mesa caindo".

Então eu ouvi alguém gritar lá de baixo, 'Corra'!  

Várias crianças correram para um supermercado próximo gritando e pedindo ajuda, disseram testemunhas.

Takuma foi subjugado por dois professores e preso.

O assassino era um ex-presidiário que havia sido condenado por estupro antes do ataque da escola em Osaka. Ele havia sido diagnosticado com esquizofrenia e psiquiatras suspeitavam que ele tivesse um transtorno de personalidade paranoide.

Massacre num centro psiquiátrico em Sagamihara

A chacina ocorreu em 27/07/2016, em Sagamihara, cidade de 700 mil habitantes. O agressor, que chegou a trabalhar por um tempo no centro, teria quebrado as janelas para entrar no lugar, onde havia 160 internos.

O autor da matança já havia enviado em fevereiro de 2016 uma carta ao presidente da Dieta, a câmara baixa do parlamento japonês, ameaçando matar 470 deficientes.

Na carta, o japonês Satoshi Uematsu dizia que essas matanças seriam uma "revolução", que impediriam "a Terceira Guerra Mundial", segundo a imprensa japonesa.

Uematsu, que confessou ter assassinado 19 pessoas em um centro para deficientes mentais sorriu para as câmeras midiáticas ao ser levado para interrogatório.

A polícia revistou a casa do homem de 26 anos, que sempre defendeu a teoria de que "pessoas com problemas mentais deveriam desaparecer". Foi isso que o levou na terça-feira a assassinar os pacientes a facadas.

Com um casaco azul cobrindo sua cabeça, Uematsu foi escoltado da delegacia de polícia até uma van, ante uma multidão, depois, dentro do carro sorriu para os repórteres.

Durante a chacina, Uematsu amarrou os funcionários do centro e começou a atacar os deficientes com facas e, depois do massacre, se entregou à polícia, declarando que "todos os deficientes deveriam desaparecer".

As vítimas foram 9 homens e 10 mulheres com idades entre 18 e 70 anos.
Entre os 25 feridos, 20 sofreram "cortes profundos no pescoço", segundo um médico. As vítimas foram levadas a seis hospitais diferentes.

Os japoneses se questionavam um dia após o pior massacre registrado no país porque foi permitido que ele deixasse o hospital sem uma avaliação mental mais profunda.

A polícia da localidade de Tsukui não quis fazer comentários sobre a investigação, limitando-se a informar que o agressor foi levado para um tribunal para ser interrogado.

A imprensa local informou que Uematsu teria dito aos policiais que queria pedir desculpas às famílias das vítimas pela perda súbita de seus entes queridos, mas que não se arrependia do que tinha feito

"Eu salvei pessoas com muitas deficiências", teria comentado. Massacres deste tipo são muito raros no Japão, que tem uma legislação de controle de armas muito severa e uma taxa de criminalidade relativamente baixa.

O Japão está entre os países mais seguros do mundo, embora tenha um histórico horrendo de violência em massa. Quais as razões?

O Ministério da Justiça do Japão em 2013, na "Pesquisa em casos indiscriminados de assassinatos e feridos em massa", examinou 52 casos em que um indivíduo gravemente feriu e/ou matou pessoas que não conhecia sem um motivo claro na tentativa de aprender com eles e, esperançosamente, evitar ataques semelhantes concluiu que impulsos suicidas não tratados poderiam levar tragicamente a homicídios.

Ao mesmo tempo, o relatório classificou os ataques como estimulados por 5 motivos distintos: 42% dos casos foram alimentados por rancor, enquanto 19% foram motivados por raiva ou inveja em relação a um grupo ou entidade; 17% desejavam escapar da sociedade de encarcerados; 11,5 % desejavam cometer suicídio ou serem mortos em flagrante e 9,6 simplesmente queriam matar.

Outros incluídos no relatório não deram um motivo claro, mas acredita-se que drogas ou doenças mentais foram os propulsores do crime. Primeiro, o relatório constatou que muitos assassinos em massa haviam sido institucionalizados(presos) anteriormente. Como resultado, segundo o relatório, as pessoas que foram encarceradas por atos violentos precisavam receber tratamento contínuo depois que fossem libertadas.

Curiosamente, o relatório sugeriu, de forma lacônica apenas uma alternativa, a seguir resumida:

Para fazer com que esses indivíduos não se sintam socialmente isolados, precisamos trabalhar com todas as opções e instalações para lidar com doenças mentais e evitar comportamentos suicidas, para que as pessoas acreditem que têm 'uma chance no mundo' e um local em que se sintam em casa.

Infelizmente, as estratégias japonesas não conseguiram parar a incidência de massacres sejam com arma branca ou machado e até por incêndio criminoso.

Com efeito, as últimas carnificinas aconteceram, respectivamente com o assassinato em novembro de 2018, de um grupo de 6 pessoas, incluindo uma criança de 7 anos, em Takachiho, na província de Miyazaki e no incêndio doloso provocado pelo ex-presidiário Shinji Aoba (que também tinha problemas mentais) que deixou 33 mortos e 36 feridos, num estúdio de animação em Kyoto.

CONCLUSÃO
Apesar de que nos dois primeiros episódios de massacres nas cidades japonesas, nitidamente, percebe-se que os protagonistas são psicopatas, nem sempre esses assassinos frios e sem qualquer dose de empatia, tem uma doença mental, como afirma o psicólogo Prof. Dr. Peter Langman, que há mais de 10 anos, conduz pesquisas para entender os estados psicológicos e as circunstâncias da vida desses criminosos.

O trabalho de Langman também identificou uma verdade subestimada: não há sintomas específicos, características pessoais ou condições associadas a alguém que cometeu esses crimes, embora uma observação detida possa revelar traços marcantes de desatino ou de uma sociopatia e, até mesmo de um planejamento de um atentado.

Desta forma, temos uma grande dificuldade de identificar esses lobos solitários, que, em sua larga maioria, surpreende a todos que conviveram com eles, quando de repente se transformam em assassinos em massa.

Ao fim e ao cabo, algumas evidências restam proeminentes: o fenômeno dos assassinatos em massa não é típico apenas de sociedades mal resolvidas como o Brasil, países africanos ou do mundo árabe, bem como de países com violências setorizadas como os Estados Unidos, Alemanha, Espanha e França; os atentados no Japão, têm porém, uma peculiaridade, o uso de arma branca, opção típica em nações onde há um severo controle de armas de fogo.

Desde 2018, não tem havido mais atentados (contra uma pluralidade de pessoas) com arma branca no Japão, exceto o incêndio criminoso, ocorrido em julho de 2019, que ceifou 33 vidas, num grande estúdio de animação na cidade de Kyoto. Isto, em suma significa que o Japão, mesmo com toda tecnologia e alto grau de civilização ainda não eliminou o grave problema dos crimes em massa.

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